Fim de ano é oportuno para revisar nossas vidas, identificar desafios, decidir novos projetos e renovar esperanças. Os problemas sociais gravíssimos que enfrentamos, causados não somente pela pandemia, não podem ser desconsiderados nessa reflexão, afinal eles nos impõem limites. Por um lado, nossas escolhas pessoais determinam o rumo da nação. Por outro lado, a realidade do país nos condiciona.
Pessoalidade e coletividade, de fato, se interligam. Informações que dispomos, interpretações que fazemos e nossos posicionamentos pessoais, sobretudo em questões públicas, afetam também a todos. O necessário “balanço” de nossas vidas supõe, portanto, critérios éticos também sociais. A liberdade que defendemos, implica igualmente responsabilidade social, nem sempre valorizada e exercida.
Informações distorcidas que absorvemos de veículos poderosos de comunicação e muitas vezes compartilhamos, bem como análises tendenciosas sobre a realidade, revelam, no mínimo, superficialidade. Cabe-nos revisar o hábito de crer em todo tipo de informação, sem interpretar os interesses em jogo, e reconhecer quanto somos desinformados sobre o que é relevante em nossa vida social.
Imersos na cultura da informação, vivemos sob o signo da desinformação, desafio este a ser encarado por quem preza por lucidez. O desmonte feito nos últimos anos de muitas estruturas de representação da sociedade civil, criadas para orientar a implementação de políticas públicas, é um exemplo significativo de cerceamento da informação, da participação e do Estado Democrático de Direito.
Se muitos não compreendem o que está acontecendo no Brasil, que tentem pelo menos entender os sinais de contradição, a partir da extrema precariedade, do crescimento da miséria e do aumento da fome. A gravidade da situação merece uma parada para reflexão. Vale a pena insistir no que dá provas de insucesso? Quem ainda não enxerga, abra os olhos, pois cego, de fato, é quem não quer ver.
Nesse sentido, a cura do cego de Jericó, narrada por Lucas, é significativa. “Vê! A tua fé te salvou” diz-lhe Jesus, em atenção ao seu clamor: “Que eu veja!” (Lc 18,41-42). Com a mesma compaixão de Cristo, entidades signatárias do Pacto pela Vida e pelo Brasil, entre as quais a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, abrem-nos os olhos com sua declaração conjunta do último dia primeiro de dezembro:
“A crise sanitária escancarou um país injusto e desigual, com altos índices de desemprego e insegurança alimentar, e a Constituição Federal de 1988 prescreve, no seu art. 6º, que são direitos sociais do povo brasileiro ‘a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados’”.
“Direitos sociais não são favores de governos, mas deveres do Estado”. Essa declaração interpela-nos, assim, à proatividade. Assumamos pessoalmente e coletivamente esse desafio, inspirados na coragem comunicada por Cristo a quem lhe suplica ajuda: “tudo é possível a quem crê” (Mc 9,23). Incorporemos esse corajoso apelo em nossos projetos pessoais e coletivos para 2022, com renovada esperança!
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Dom Reginaldo Andrietta, bispo da Diocese de Jales-SP e referencial da CNBB para a Pastoral Operária Nacional