A Igreja no Brasil, por meio das Pastorais e Organismos Sociais, inicia articulação para realização da Jornada Mundial dos Pobres 2022
Por Osnilda Lima | 6ªSSB e Pastorais Sociais
A Comissão Episcopal Pastoral para a Ação Sociotransformadora da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (Cepast-CNBB), que articula e anima as Pastorais e Organismos Sociais, realizou o 2ª encontro com a equipe executiva que mobiliza a Jornada Mundial dos Pobres.
A equipe, representada pelas Pastorais e Organismos Sociais, vem a refletir para incluir a Jornada Mundial dos Pobres num processo de enfretamento à pobreza no país. “Aqui no Brasil estamos avançando com o objetivo de envolver as Pastorais, os Organismo e Movimentos para pensar processos, não somente o evento no Dia Mundial Pobres, não ficarmos somente em ações caritativas, mas pensar ações que desencadeie processos. Ou seja, como a Jornada se conecta com as demais ações da Igreja no Brasil?”, ressaltou frei Olavio Dotto, assessor da Cepast-CNBB.
Com isso, para o 2º encontro ocorrido na quarta-feira (13/07), colaboraram na reflexão, para fortalecer a construção desse processo, a professora Márcia Maria de Oliveira, Doutora em Sociedade e Cultura na Amazônia e o professor Francisco Aquino Junior, Doutor em Teologia. Márcia contribuiu na perspectiva do combate à fome, a partir da enfrentamento a crise socioambiental, pois segundo ela, não se trata somente de uma crise climática, mas moral e ética, que leva o descarte humano e à ação predadora ambiental. Já Aquino trouxe a provocação de que é necessário articular simultaneamente três elementos para enfrentar à pobreza: a dimensão assistencial imediata, as políticas públicas e o estrutural.
O professor ressaltou que no âmbito interno da Igreja o mais comum é o assistencial e as pastorais e organismos estão mais centradas nas politicas públicas. Contudo, segundo ele, é preciso perceber que há limites e trouxe como exemplo a experiência que vive em seu território, no Vale do Jaguaribe, no Ceará. “Estou no Vale do Jaguaribe, na fronteira com o Rio Grande do Norte, terra do agronegócio, região de disputa hídrica. É muito importante a politica de um milhão de cisternas, é uma política de estado muito importante. Mas enquanto o estado banca cisterna de placa para os pobres, toda a macro política hídrica está voltada para o agronegócio: é transposição, é barragem, é canal. A água tem um direcionamento”, observou.
Aquino lembrou, ainda, que há comunidades que moram em cima do aquífero Jandaíra – uma das maiores reservas hídricas do Nordeste –, e recebem água de caminhão pipa para abastecimento das cisternas. “A água da transposição não é para os pobres, essa água sempre teve um destino”, enfatizou.
O professor colocou a pergunta: “Como articular o assistencial imediato, que é necessário; as políticas públicas, que têm a sua importância com o aspecto estrutural?. Há várias iniciativas que barram no aspecto estrutural do acesso à agua, à terra, por exemplo”. Ele lembrou que quando o papa Francisco provoca à dimensão da ação social, ele têm no horizonte os processos de movimentação da sociedade em torno de lutas por direitos concretos, por políticas concretas.
Por fim, o professor sugere que os temas da fome e da violência devem iniciar um processo que desencadeie na apresentação de uma agenda política, pois são problemas que articulam e conectam uma série de violências e problemas na sociedade e que atinge diretamente a população empobrecida.
A fome vinculada à questão socioambiental
“A questão ambiental está ligada a outras misérias na sociedade. Miséria produzida socialmente. Nós temos um sistema econômico que produz a miséria, que extrapola a condição humana e atinge a sociedade e os grupos humanos organizados que fazem resistência. É uma produção que vem de cima para baixo”, advertiu a professora Márcia.
Marcia lembrou que o discurso de ampliar a produção da monocultura para combater a fome no mundo não se sustenta, pois a mesma promove impactados socioambientais devastadores. “Há um projeto de aniquilação, de violação daqueles e daquelas que produzem alimentos. A parcela que produz o alimento está cada vez mais reduzida, cada vez mais criminalizada por fazer frente, por criar o embate com o sistema de produção da monocultura, ou da produção voltada apenas para a exportação”, observou.
A professora lembrou que “o sistema capitalista não foi feito para toda sociedade, ele foi pensando para um grupo reduzido. É parte desse sistema reduzir os espaços de participação e, ao mesmo tempo, ir eliminando as pessoas que não estão contempladas nesse processo”, advertiu.
O enfrentamento à fome e à garantia da segurança alimentar, de acordo com Márcia, “passa necessariamente pela agricultura familiar, pela agroecologia, pelos canteiros produtivos, pelos espaços de produção domésticos, caseiros, comunitários, coletivos”. Ela lamentou que as pessoas que ocupam esses espaços são atacadas pelo sistema que lhes tira a garantia de sobrevivência.
Conforme a professora, diante da crise socioambiental, que faz parte de uma ciranda de outras crises, no processo acelerado de usurpação da terra, celeiro a ser explorado, a questão da ecologia integral, proposta pelo papa Francisco é fundante: a ética do cuidado, da cooperação e reciprocidade, onde tudo está interligado. Com isso, segundo Márcia, os sinais de esperança estão na resistência dos povos originários, quilombolas, comunidades tradicionais, nas periferias das cidades que se somam numa grande aliança para estabelecer um outro modo de sociedade.
A Jornada Mundial dos Pobres
Em 2016, no dia 20 de novembro, na conclusão do Ano Santo Extraordinário da Misericórdia, o papa Francisco instituiu o Dia Mundial dos Pobres, data a ser lembrada um fim de semana antes da celebração litúrgica da Festa de Cristo Rei do Universo. Na mensagem de lançamento Francisco disse: “Este dia pretende estimular, em primeiro lugar, os crentes, para que reajam à cultura do descarte e do desperdício, assumindo a cultura do encontro. Ao mesmo tempo, o convite é dirigido a todos, independentemente da sua pertença religiosa, para que se abram à partilha com os pobres em todas as formas de solidariedade, como sinal concreto de fraternidade”.
No Brasil, a CNBB confiou à Cáritas Brasileira a animação e a mobilização do Dia Mundial dos Pobres. A entidade, nesse período, já realizava a Semana da Solidariedade para pensar e agir por um país justo, fraterno, igualitário, solidário e amoroso, por ocasião de seu aniversário de fundação, 12 de novembro de 1956. No decorrer dos anos, as demais Pastorais e Organismos Sociais se envolveram no processo de construção e assumiram a animação da Jornada Mundial dos Pobres da Igreja no Brasil.
VI Dia Mundial dos Pobres
Na mensagem deste ano, para o Dia Mundial dos Pobres, 13 de novembro, o papa Francisco enfatiza: “A pobreza que mata é a miséria, filha da injustiça, da exploração, da violência e da iníqua distribuição dos recursos. É a pobreza desesperada, sem futuro, porque é imposta pela cultura do descarte que não oferece perspectivas nem vias de saída". Acesse a íntegra da mensagem aqui