Em entrevista, Sandra Guimarães fala sobre as conexões entre o veganismo popular, a agroecologia, a reforma agrária e a cozinha da terra no Brasil
Por Marco Weissheimer | Sul21
O que está no prato nosso de cada dia mostra o que está acontecendo no campo perto de onde vivemos. Se, no nosso prato só tem arroz e carne fundamentalmente, pode ter certeza que o campo perto de sua casa é pasto. A mesa, assim, longe de ser um espaço inocente, também é um território de disputa política. Quando a gente escolhe colocar carne no prato, estamos ajudando a fortalecer o modelo do agronegócio, o desmatamento. Quando a carne é protagonista do prato, o agro é protagonista do campo. Sandra Guimarães, ativista vegana, nordestina, cozinheira, filha de assentados do MST e editora do blog Papa Capim resume assim o campo de disputa social, política e simbólica que se estabelece toda vez que fazemos uma refeição. Isso considerando a parcela da população que tem a oportunidade de fazer refeições regulares, uma vez que o Brasil, no governo Bolsonaro, voltou ao mapa da fome. E o retorno da fome, para a filha de sem terra que se tornou uma das principais ativistas veganas e antiespecistas do país, também está relacionado ao modelo baseado no agronegócio, onde a soja vem avançando sobre as plantações de feijão. “Onde a soja avança, o feijão recua”, resume.
Sandra Guimarães esteve em Porto Alegre na semana passada para participar da etapa local da primeira Jornada do Veganismo Popular contra o Fim do Mundo, um ciclo de atividades que vem sendo promovido em todas as regiões do país pela União Vegana de Ativismo (UVA), uma rede que existe há quatro anos e articula quase 40 coletivos no Brasil. Diante do problema do retorno da fome, esses coletivos defendem que é preciso resgatar a comida da terra, de base vegetal, alimentos tradicionais como feijão, milho e aipim, que vem perdendo espaço no campo brasileiro com a expansão do agronegócio. Entre as diversas atividades das quais participou no Rio Grande do Sul, Sandra Guimarães visitou um assentamento do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) em Eldorado do Sul, que é modelo em produção agroecológica e biodinâmica e é sede também da padaria Pão da Terra, construída por mulheres assentadas que prometeram, quando estavam acampadas em uma situação onde a fome era uma companhia cotidiana, que, quando conquistassem a terra, fariam o melhor pão do mundo. Sandra ouviu essa história da boca de uma de suas protagonistas, Maria Inês Riva, que contou emocionada como a promessa se tornou realidade.
Ela também fala sobre suas primeiras impressões sobre a cultura alimentar do Rio Grande do Sul (foi a primeira vez que ela visitou o Estado). “De todas as culinárias que eu vi até aqui, achei a do Rio Grande do Sul a mais colonizada. Muito leite, muita carne. Para mim, a cultura alimentar do Rio Grande do Sul é o ápice da colonização alimentar no Brasil. É a que mais se separou da comida original da terra e mais se aproximou dos colonos”.
O trabalho desenvolvido pelo MST em seus assentamentos, produzindo arroz orgânico, promovendo a agroecologia e práticas como a agricultura biodinâmica, valorizando e resgatando alimentos de base vegetal que fazem parte da culinária tradicional brasileira é, para Sandra Guimarães, uma das estratégias centrais para enfrentar, ao mesmo tempo, o problema da fome no Brasil, e a ideologia especista que coloca a espécie humana como uma entidade superior no planeta, autorizada a explorar, controlar e matar seres de outras espécies. Em entrevista ao Sul21, concedida no assentamento do MST em Eldorado do Sul, ela fala sobre essas relações e destaca a conexão que há hoje entre o veganismo popular, a reforma agrária e a agroecologia. “A gente acredita que para sair do mapa da fome e conseguir alimentar a população, vamos precisar da reforma agrária e da agroecologia, mas também rever a nossa cultura alimentar. Na verdade, não é nem rever. Descolonizar é a palavra correta, voltar para a base da nossa cultura alimentar, que é vegetal. Voltar para a macaxeira ou aipim como vocês chamam aqui, para o milho, para o feijão. Sem a revalorização da nossa comida da terra, que é vegetal, não conseguiremos sair desse cenário atual”, defende.
Você está fazendo um roteiro por várias cidades do País, promovendo um debate sobre o veganismo popular, o antiespecismo e os nossos atuais padrões alimentares. Na tua avaliação, o que essa agenda representa hoje na sociedade, considerando o momento que vivemos no Brasil e no mundo?
Sandra Guimarães: Nós estamos organizando o que estamos chamando de primeira Jornada do Veganismo Popular contra o Fim do Mundo, pelo combate à fome e pela libertação animal. Eu faço parte da União Vegana de Ativismo (UVA), que é uma rede que existe há quatro anos e conecta quase 40 coletivos no Brasil inteiro. Estamos vivendo um momento histórico agora, pois a UVA nasceu entre o primeiro e segundo turno das eleições de 2018, quando era urgente se organizar e estávamos vendo também pessoas veganas apoiando Bolsonaro. Vimos que era o momento de nos organizarmos politicamente. Hoje, quatro anos depois, organismo um mês inteiro de atividades no Brasil inteiro, juntamente com a Xepa Ativismo e os meninos do Vegano Periférico. Fizemos uma live de abertura e os coletivos ligados à UVA realizaram atividades diversas em seus territórios. Eu tentei participar o máximo possível dessas atividades.
Nós achamos importante realizar essas conversas agora, pois estamos vivendo um cenário onde o Brasil voltou ao mapa da fome e o agro domina. Foi muito interessante ver, depois do primeiro turno da eleição, ver que onde Bolsonaro teve o maior número de votos coincide perfeitamente com a região do agronegócio, do arco do desmatamento e também com os estados onde há o maior número de abatedouros e de rebanhos, especialmente bovinos e suínos. Sentimos que era o momento de mobilizar o pessoal. A gente acredita que para sair do mapa da fome e conseguir alimentar a população, vamos precisar da reforma agrária e da agroecologia, mas também rever a nossa cultura alimentar. Na verdade, não é nem rever. Descolonizar é a palavra correta, voltar para a base da nossa cultura alimentar, que é vegetal. Voltar para a macaxeira ou aipim como vocês chamam aqui, para o milho, para o feijão. Sem a revalorização da nossa comida da terra, que é vegetal, não conseguiremos sair desse cenário atual.
Estive em Belém e em Porto Alegre, passando pelo Nordeste e pelo Sudeste também, sempre encontrando os coletivos locais. A gente se articula muito com o MST. Em quase todas as cidades onde foram realizados esses encontros, nós fomos ao Armazém do Campo e às sedes do MST. A mensagem é muito clara: o veganismo popular se articula com o MST porque sem reforma agrária não haverá condições de plantar comida para todo mundo. E não conseguiremos superar a exploração animal enquanto não houver plantas suficientes. Essa é a ideia por trás dessa grande viagem onde estou acompanhando os eventos em cada território.
Para algumas pessoas, essa agenda do veganismo seria uma espécie de “luxo” considerando o atual contexto que estamos vivendo, especialmente, no caso brasileiro, com o agravamento do problema da fome. A gente viu aqui hoje no assentamento em Eldorado do Sul, tanto na horta quanto na padaria, o quanto essa associação entre a ideia de comida de verdade e alimentação de origem vegetal parece bem natural. Só que isso ainda parece meio distante da percepção popular, apesar de um prato com arroz e feijão fazer parte do nosso cardápio mais tradicional. Como você acredita que seja possível dar mais visibilidade a essa conexão?
Sandra Guimarães: Acho que tem três pontos aí. O primeiro é desmistificar essa ideia de que o veganismo é algo de elite e que uma alimentação vegana é cara. Eu já parto do princípio de que não existe comida vegana, mas sim comida vegetal. Veganas são as pessoas. Então, primeiro é preciso quebrar esse preconceito de que comida vegetal é cara. Comida vegetal é comida do proletariado. É arroz, macaxeira, feijão, milho, tapioca, cuscuz. Por outro, a gente também precisa fazer uma mudança de consciência por meio da educação para promover uma valorização do alimento vegetal. Hoje, feijão e arroz estão associados à privação, à falta e à escassez, quando, na verdade, a alimentação de origem vegetal está ligada à abundância. Hoje a gente visitou uma horta agroecológica e vimos uma abundância muito grande, com mais de 90 espécies de hortaliças.
Em terceiro lugar, as pessoas precisam ter consciência de o quanto a nossa alimentação foi colonizada. As pessoas não sabem, esquecem ou não querem saber que vacas, porcos e ovelhas foram trazidas para cá pelos invasores. A nossa comida nativa – o feijão, o milho, a mandioca, vários tipos de amendoim – tudo isso já existia, mas passa a ser considerado comida de nativo, que é inferior, e a gente acabou assimilando esse querer a comida do colonizador. É incrível como isso realmente entrou na mesa, entrou em tudo. Hoje em dia, tudo tem leite, tudo tem leite condensado, tem manteiga. É muito difícil a gente encontrar comida que seja realmente vegetal.
Então, acho que é preciso trabalhar nestes três níveis: falar para as pessoas que comida vegana é comida da terra e não é cara, associar abundância à comida da terra e, em um terceiro nível, descolonizar o nosso paladar e a nossa mesa. A mesa é um território de disputa. O estômago é um território colonizado. Precisamos tirar o colonizador do estômago. Quando a gente escolhe comer como o colonizador, a gente está apoiando esse projeto. Quando a gente escolhe colocar carne no prato, estamos dando um pouquinho mais de força para o agro. Quando a carne é protagonista do prato, o agro é protagonista do campo. Já quando o protagonista do seu prato é o alimento agroecológico vegetal, você está apoiando a agricultura familiar, a agricultura de assentados e assentadas.
É um trabalho muito grande que estamos fazendo e há muitos coletivos envolvidos nele. Estamos nos organizando agora e nos politizando. A gente defende a vertente do veganismo popular, que é uma vertente politizada que entende que, sem reforma agrária, não haverá fim da exploração animal, que sem sair do capitalismo não vamos conseguir acabar com o especismo e que mais empresas de ultraprocessados vegetais não é a solução.
Estamos começando a colher os frutos desse trabalho. A gente já tem uma abertura com o MST e com o pessoal da Teia dos Povos também. Eles têm nos convidado para muitas conversas e atividades conjuntas. Conseguimos diálogo até com o PT, que tem uma setorial de Direitos Animais e nos convidou para conversar sobre esse tema. Então eu vejo que as coisas estão mudando. Após muitos anos de luta, a gente sente que tem essa abertura na esquerda. A gente conversou há tantos anos, né? Quando você me entrevistou pela primeira vez eu falei que, para mim, o veganismo fazia parte do projeto da esquerda. Naquela época, ninguém escutava. Todo mundo ria, dizia que o veganismo era uma modinha de gente rica que mora em cidades. Acho que isso mudou muito. Há um interesse maior, ainda que a pauta antiespecista não seja considerada uma pauta em todas as esquerdas. Para mim, um projeto de esquerda é incompleto sem a luta antiespecista.
O que é exatamente o antiespecismo? Esse ainda é um conceito desconhecido para muita gente. Em que medida o antiespecismo se confunde com o veganismo?
Sandra Guimarães: O especismo é uma ideologia que justifica a opressão e dominação das outras espécies, que acredita que a espécie humana é superior e tem o direito de controlar o corpo, a vida e a morte das outras espécies. Há algumas nuances dentro do especismo, uma hierarquia. A gente adora cachorro, não come cachorro, mas vai comer a vaca. Acha o gato lindo e maravilhoso, nosso filho, e vai comer a galinha. Nós somos antiespecistas, queremos construir outra relação com os seres vivos. Nós fazemos parte da natureza, mas somos só uma espécie, como qualquer outra. O veganismo é a prática do antiespecismo. Como é que você pratica o antiespecismo? Boicotando os produtos vindos da exploração animal. Eu defino hoje o veganismo como uma prática de solidariedade política com as outras espécies.
Então, não se trata de uma dieta, um regime alimentar ou um modo de vida. É uma prática de solidariedade. Se a gente quer ser coerente com a nossa luta, que é superar o especismo, criando uma sociedade que respeite todos os seres, precisamos praticar isso. Não posso me dizer antirracista e ter uma prática racista no meu cotidiano. Não posso me dizer feminista e ter uma prática machista no meu cotidiano. Então, nós, veganos, aliamos a prática à teoria.
Na outra entrevista que fizemos, em 2018, você destacou o tema da conexão entre todas as formas de opressão. A tua trajetória recente tem duas experiências internacionais que dialogam diretamente com essa questão: uma na Palestina, nos territórios ocupados por Israel, e outra em Paris, onde mora agora em uma região repleta de refugiados vindos de diferentes países. Você disse que a figura dos refugiados climáticos já é uma coisa muito real. Após esses anos de pandemia, parece que essa conexão entre as formas de opressão ficou mais evidente. Como avalia a evolução (ou involução) dessa conexão nos últimos anos?
Sandra Guimarães: Sim, essas conexões ficaram mais claras. Nós, como antiespecistas, viemos denunciando isso desde sempre. O especismo é uma grande estrutura com várias camadas de dominação. A partir do momento em que a espécie humana traçou uma linha entre humanos e não humanos e estabeleceu que quem estava depois dessa linha não tinha direito de existir, criou-se um modelo que foi repetido dentro dos grupos humanos. A partir da fixação dessa linha entre humanos e animais, pode-se, depois, animalizar ou desumanizar certos grupos humanos.
Historicamente, aqui no Brasil, nós temos o grupo das pessoas negras que foram desumanizadas. Se aceitamos a existência dessa categoria “animal” e que ela seja explorada e morta, a gente pode usar esse mesmo pensamento para pegar alguns seres humanos, colocar do lado de lá dessa linha e dizer que a opressão deles também é justificável. Nós desumanizamos ou animalizamos todos os grupos que a gente quer controlar. Por isso defendemos que um projeto de esquerda, ou qualquer projeto que seja anti-dominação e anti-opressão não estará completo se não combater o especismo.
Na Palestina, eu vi como o exército israelense animalizava o povo palestino. Eu li recentemente que, quando lançaram as bombas atômicas sobre Hiroshima e Nagasaki, o então presidente dos Estados Unidos na época disse que eles (japoneses) eram animais e deveriam ser tratados como tais. Então, seja japonês, vietnamita, palestino ou o refugiado que está vindo do Paquistão, esses grupos serão sempre humanos do que os humanos. A gente sabe quem é humano: o branco, ocidental, heterossexual, geralmente homem. Essa é a base do que é considerado humano. Tudo que sai fora desse grupo é um pouco menos humano e quanto menos humano você for mais oprimido você vai ser e mais essa opressão estará invisível. Ah, dirão, são paquistaneses, são muçulmanos, são árabes…
Na França, existe hoje um racismo gigantesco. Vocês não imaginam o que é aqui. Tanto contra os povos negros que vêm da África, como contra os árabes. É gigante. A pessoa negra tem quatro vezes mais chance de ser parada pela polícia na rua. A pessoa árabe tem seis vezes mais chance de ser parada. O povo árabe é ainda mais oprimido por conta do mito do terrorista. Mas a ideologia de base é sempre a mesma: a gente desumaniza certos grupos humanos, que causam problemas, e uma vez que se tirou a humanidade ou se colocou um pouco mais de animalidade neles todo tipo de opressão é permitido. E ninguém vai se doer com isso. Veja o que aconteceu com os refugiados ucranianos que chegaram da guerra. Eles foram acolhidos. Não estou falando que não era para acolher. Todo refugiado fugindo da guerra tem que ser acolhido. Mas como eram europeus, brancos, o tratamento foi totalmente diferente, porque esse grupo é “mais humano” e corresponde ao que se considera como um ser detentor de todos os direitos. Já os refugiados do Sudão, que são negros e muçulmanos, esses continuam nas ruas sendo perseguidos pela polícia.
Esse tema saiu um pouco do noticiário nos últimos meses, mas continua o movimento de chegada de refugiados vindos da África e Oriente Médio, com pessoas tentando atravessar o Mediterrâneo e morrendo afogadas no mar?
Sandra Guimarães: O tempo inteiro. Toda semana a gente recebe notícias sobre isso. Dizem que o Mar Mediterrâneo é, hoje, o maior cemitério que a gente tem. As pessoas tentam atravessar o mar fugindo da seca, da guerra e de condições econômicas onde é impossível sobreviver. Inclusive, a França, que é o terceiro maior exportador de armas do mundo, arma esses países que depois vão perseguir parte da população gerando novas ondas de refugiados que tentam ir para a França ou para outros países da Europa onde serão perseguidos, se não morrerem tentando atravessar o Mediterrâneo. São pessoas que saem do norte da África, de países como Líbia, Argélia, Tunísia, Marrocos, e tentam ingressar no sul da Europa. Quando conseguem fazer a travessia muitas vezes são colocados em campos de detenção. São vidas que importam menos porque são vidas consideradas menos humanas. Imagine se isso acontecesse com franceses? Estaria em todos os jornais do mundo.
Essa é a primeira vez que você vem a Porto Alegre. Considerando esses dois dias que passou aqui e o contato que teve com a comida daqui, qual sua primeira impressão sobre a cultura alimentar que viu aqui, comparada a de outras regiões, especialmente Norte e Nordeste, que você conhece bem?
Sandra Guimarães: É a primeira vez que venho a Porto Alegre. Já tinha ido a Florianópolis e Curitiba, mas aqui no Rio Grande do Sul é a primeira vez. Como estou vindo do Nordeste e do Norte, para mim está bem visível a diferença com a comida daqui. É uma cultura alimentar muito diferente. Eu estava comentando hoje mesmo com os camaradas do coletivo que me chamou a atenção como as pessoas comem pouco feijão aqui, comparado ao Nordeste. A gente estava conversando com a Maria Inês (assentada em Eldorado do Sul) aqui agora e ela contou que a primeira coisa que eles decidiram plantar foi feijão e milho, para matar a fome do povo. Porque é isso que mata a fome. A natureza é tão perfeita que feijão e milho junto é uma proteína completa.
Eu fiquei impressionada com a quantidade de feijão que não se come aqui. Isso tem a ver, claro, com a história dessa região que teve um povoamento diferente. A cultura alimentar daqui foi construída com outros elementos. No Nordeste e no Norte come-se feijão todo dia. A presença da macaxeira (do aipim) também é muito maior, o que eu já imaginava. Mas eu achei que ia encontrar mais milho aqui, um alimento que faz parte da cultura tradicional dos povos guarani. De todas as culinárias que eu vi até aqui, achei a do Rio Grande do Sul a mais colonizada. Muito leite, muita carne. Para mim, a cultura alimentar do Rio Grande do Sul é o ápice da colonização alimentar no Brasil. É a que mais se separou da comida original da terra e mais se aproximou dos colonos. Achei bem diferente mesmo, mas acho que dá para recuperar. O milho ainda está aqui e o mate também. Uma das poucas coisas que ficou dos povos originários, aliás, foi o mate.
Sem uma revalorização do feijão vai ser difícil a gente combater a fome e parar a exploração animal. Uma pessoa que não come feijão, vai comer carne e arroz todo dia. Se ela não comer a carne, vai comer arroz e batata? Não dá, é um prato incompleto. O feijão é a base e sem ele vai ficar difícil fazer uma transição alimentar. O atual modelo alimentar dominante é egoísta. Quando a sua dieta é baseada em carne, queijo e leite, a produção deles usa tanta terra e tanta água que vai faltar para outras pessoas. Essa obsessão por proteína que existe hoje no Brasil e no mundo se expressa numa dieta egoísta. Se todo mundo quiser se alimentar desse jeito, não tem condições, vai faltar comida pra muita gente. Se a maneira como eu como não pode ser reproduzida por todo mundo, isso está errado. Não pode ser assim. Voltando à sua pergunta, achei a culinária daqui a mais visivelmente colonizada e a que mais perdeu o contato com a comida de base vegetal.