Projeto sonhado se tornou possível pela parceria das comunidades, da Unisinos e do apoio das secretarias da prefeitura municipal.

Por Ivan Júnior e Marilene Maia | IHU

No Brasil, o acesso à moradia é um direito social assegurado pela Constituição Federal de 1988, bem como a saúde, a alimentação, a educação e o trabalho. Conforme estabelecido pela legislação, o direito à moradia é uma competência da União, dos estados e dos municípios que têm a atribuição de "promover programas de construção de moradias e a melhora das condições habitacionais e de saneamento”.

De acordo com dados levantados pela Campanha Nacional Despejo Zero, mais de 142 mil famílias estão ameaçadas de despejo no Brasil. Somente no Rio Grande do Sul, são mais de 8,1 mil lares que sobrevivem sob a ameaça de despejo a qualquer momento. No país, a maior parte das famílias que fazem parte do déficit habitacional, ou seja, que não têm onde morar e com renda de até R$ 1,8 mil reais.

Conforme dados da Campanha, que foi criada por um coletivo de organizações e movimentos em junho de 2020, em defesa da vida no campo e na cidade, o Governo Federal cortou 98% dos recursos para a produção de novas unidades habitacionais para famílias com renda de até R$ 1,8 mil. A pandemia escancarou e complexificou a realidade que articula “ausências”: crescente déficit habitacional, ausência de políticas de habitação de interesse social e estagnação de investimentos em políticas sociais.

Visita de casa em casa para o cadastramento de todas as famílias moradores na ocupação Renascer

O grande problema é que a maior parte da população que não tem onde morar faz parte do grupo que vive com praticamente um salário-mínimo e meio. Ainda dentro deste contexto, o programa Minha Casa Minha Vida foi encerrado pela União e, desde então, o programa de habitação se chama programa Casa Verde Amarela, que não possui investimentos para a construção de habitações de interesse social.

O problema da moradia se soma ao desemprego e a perda de renda, consoante aos índices levantados pela campanha contra o despejo, em 2022. No Brasil, o número de pessoas que passam fome chega a 33 milhões, o desemprego alcança 12 milhões e 70% das famílias ganham até dois salários-mínimos. Com a inflação em disparada, o poder de compra é afetado, principalmente pelo aumento no custo da alimentação, do botijão de gás e da energia elétrica.

Este cenário é enfrentado por mais de 10 mil famílias, em São Leopoldo, que vivem em ocupações urbanas com moradias precárias. Nesses territórios, as casas não têm acesso à água, esgoto, luz, internet e as pessoas são invisíveis para o poder público e para a sociedade. Inseridas neste contexto, as famílias lutam para sobreviver e pela regularização fundiária da área ocupada. Pela necessidade de saber quantos vivem e quais são as demandas de cada ocupação, foi idealizada a iniciativa "A Cidade (In)Visível: cartografia social das ocupações urbanas de São Leopoldo", em 2020.

O projeto da cartografia social das ocupações urbanas de São Leopoldo constituiu-se a partir das demandas das comunidades que participam da Rede Solidária São Léo. O coletivo é formado pelo Movimento Nacional de Luta pela Moradia - MNLM, com as lideranças de 17 ocupações urbanas de São Leopoldo, as Missionárias do Cristo Ressuscitado - MCR e a Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos, por meio de professores, estudantes e funcionários que atuam de forma voluntária.

Há mais de 20 anos cerca de 2.500 famílias buscam a garantia dos seus direitos na Ocupação Justo, em São Leopoldo.

A formação do Grupo de Trabalho de Cadastramento permitiu operacionalizar as ações da Cartografia Social e a estruturação de um Sistema de Informação Geográfica - SIG. A partir da necessidade dos dados pela Rede, foram sendo buscadas informações junto às Secretarias Municipais, que apontaram os limites de informações sobre estas realidades, assim como a sua diversidade. As entidades manifestaram o interesse em participar da construção de um instrumento comum de informações para articular os dados e a sua intervenção nestes territórios.

Seguiu-se a busca do apoio técnico da Universidade para a criação e viabilização da cartografia. Desta forma, o projeto foi concebido e segue sendo viabilizado por professores e acadêmicos de cursos de graduação e pós-graduação da Unisinostécnicos e gestores das secretarias municipais de HabitaçãoAssistência SocialSegurança Pública e, especialmente, pelas lideranças das comunidades moradoras de ocupações. O projeto, inicializado em 2020, quando se apresentou a necessidade das comunidades, é transdisciplinarintersetorial e participativo. A concepção e validação ocorrem em reuniões coletivas, que acontecem quinzenalmente com a participação das lideranças.

A definição de nome, objetivos e procedimento do projeto ocorreu em 8 de maio de 2021. Com uma discussão coletiva, foi pactuada a titulação de “A Cidade (In)Visível: cartografia social das ocupações urbanas de São Leopoldo”. O projeto tem o objetivo de promover o levantamento de dados e de informações das realidades vividas pelas comunidades e territórios das ocupações urbanas de São Leopoldo.

Os dados coletados permitem subsidiar os processos de planejamentomonitoramento e avaliação das ações, projetos, programas e políticas de proteção às famílias, aos territórios e do desenvolvimento local.

O instrumento de cadastramento das famílias e ocupações valeu-se de diferentes modelos de pesquisas e cadastramentos: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas - IBGECadastro Único - CADÚnico, entre outros instrumentos das secretarias municipais e organizações atuantes com as comunidades. O aplicativo AppSheet reuniu as perguntas e foi instalado nos smartphones dos voluntários participantes do projeto.

Dividido em duas etapas, as entrevistas iniciam com as lideranças das ocupações e, após, é aplicado, in loco, com cada família moradora. São levantados dados do perfil dos moradorescaracterísticas da moradia, no contexto dos direitos e políticas de assistência social, habitação, educação, saúde, trabalho, segurança alimentar e nutricional. As perguntas buscam identificar as características dos responsáveis familiares no aspecto de cor, de religião, de ensino, de mobilidade urbana, além de questões relacionadas à estrutura das residências e de saneamento básico.

Com esta sistematização, as ações de realização do cadastramento iniciaram na ocupação Renascer, em 2021, e, na sequência, na Steigleder, as duas primeiras a receber o projeto. Neste ano, a cartografia social seguiu na Ocupação Container. O trabalho de coleta de dados continua, a sistematização, apresentação, análise e encaminhamentos com todos os envolvidos na Cartografia. Evidencia-se, nesta última etapa de apresentação, análise e encaminhamento, a participação dos moradores das ocupações.

Impacto do Projeto nas Ocupações

Um dos participantes do projeto, Francisco Tognoli, afirma que não há como o poder público planejar ações ou políticas para uma população que está fora dos números oficiais. Ele lembra que o último Censo do IBGE ocorreu em 2010 e a realidade de vida do brasileiro mudou drasticamente e, na sua avaliação, para pior.

De acordo com Tognoli, professor e pesquisador do Programa de Pós-Graduação em Geologia da Unisinos, as ações desenvolvidas pelo projeto da Cartografia Social tiveram que suprir uma falha do Governo de Federal, que não desenvolveu o Censo, principal instrumento de caracterização da vida do povo brasileiro.

“A ação do projeto Cartografia Social é paliativa, de âmbito local, mas serviu para a universidade e para o poder público municipal terem acesso a indicadores socioeconômicos e agirem em prol destas comunidades. Revelou ainda que muitas das comunidades ocupam áreas ambientalmente sensíveis e de risco a inundações”, ressalta Tognoli.

Para Adriane Brill Thum, também membro do coletivo de cartografia social, o trabalho traz indicadores das realidades vividas nas ocupações, por meio de dados e informações sistematizadas. Desta forma, na avaliação da docente da Escola Politécnica da Unisinos, permite o subsídio para o desenvolvimento de ações tanto de outras graduações da universidade como do poder público.

Conforme ela explica, os indicadores auxiliam na construção de políticas públicas e de proteção para o desenvolvimento do território. “Temos de olhar para o todo, não somente para o centro das cidades. As periferias aumentaram com a pandemia. A cartografia social auxilia muito na organização de indicadores das realidades vividas e na busca por políticas públicas para as ocupações."

Apresentação dos resultados aos moradores das ocupações

Entre maio e junho, a Cartografia Social chega a uma nova fase. Neste momento, todos os resultados oriundos das entrevistas feitas são apresentados às lideranças e aos moradores das ocupações. A amostra com os indicadores iniciou com as três primeiras localidades que receberam o projeto: ContainerRenascer e Steigleder. Desta forma, a perspectiva passa a ser de analisar e discutir os próximos passos baseados nos dados e informações reunidos pelo coletivo.

Conforme Marilene Maia, coordenadora do Observatório da Realidade e das Políticas Públicas do Vale do Rio dos Sinos – ObservaSinos, programa do Instituto Humanitas Unisinos - IHU, o momento inaugura uma nova etapa do projeto. “A atividade permite problematizar os dados, identificando as dificuldades e o que será feito a partir de agora.” Ainda de acordo com ela, receberam o projeto as ocupações RenascerSteigleder e Container.

“A cada apresentação dos dados, um conjunto de ações são definidas e assumidas pelos diferentes agentes: comunidadePoder PúblicoUniversidade, com o envolvimento de empresas e outros parceiros. Neste sentido, já se somaram a este processo o Serviço Municipal de Águas e Esgoto do município - SEMAE, a Associação dos Funcionários da Caixa Econômica Federal – CEF, assim como outros grupos de professores e acadêmicos da Universidade, por meio de atividades de pesquisa, extensão e ensino com a curricularização”, contextualiza Maia.

Ocupação Renascer

(Foto: Ivan Júnior)

Formada por uma área aproximada de mil metros quadrados, o território reúne 42 famílias, com 141 moradores, sendo 60 crianças com menos de 12 anos de idade. A ocupação Renascer foi a primeira a receber os resultados do projeto no dia 27 de maio de 2022. Na atividade, estavam presentes moradores da comunidade, participantes do trabalho de cartografia social e representantes do poder público.

Conforme aponta Tognoli, o índice de população é variável, por causa da mobilidade das pessoas. Um dos itens que chama a atenção é o número de crianças: são 51, representando mais de 36% da população total da ocupação. Em relação à renda das pessoas, 49% vivem com até um salário mínimo para toda a família passar o mês. Em junho de 2022, o rendimento mínimo mensal, conforme a Medida Provisória 1091/21, é de R$ 1.212.

Outro índice identificado pelo trabalho de cartografia social foi relacionado aos aspectos de saúde da população. De acordo com o exposto pelo professor da Unisinos, aproximadamente 27% da população apresenta doenças crônicas, como hipertensãoepilepsiatrombosedepressão e problemas respiratórios. Ele frisa que somente os moradores com carteira assinada têm plano de saúde.

 (Foto: ObservaSinos)

De acordo com Tognoli, o aumento do desemprego e o custo de vida cada vez mais alto tornaram a ocupação a única possibilidade de ter um teto para viver. Inclusive, não pagar aluguel é fator decisivo para residir no local, e na pergunta do questionário - como a comunidade ajuda na tua vida? - 32% citam morar no local.

O levantamento mostra que 30% das casas são de alvenaria oriunda de uma construção prévia na ocupação. O professor contextualiza que a estrutura das residências tem o mínimo necessário para atender a família, pois existe incerteza sobre continuidade no local, o que limita maiores investimentos. Em relação ao maior sonho da família, 85% dos responsáveis afirmaram a regularização do território ou ter uma casa melhor.

A secretária municipal de habitação de São Leopoldo, Andréia Camilo Rodrigues, esteve presente no evento. Conforme ela contextualiza, o poder público não tem as informações apresentadas pela burocracia imposta pelo local ser uma área privada. “Por vezes, nem sabemos o que a população precisa e os dados permitem pensar as ações”, destaca Rodrigues.

(Foto: ObservaSinos)

Morador da ocupação Renascer desde 2018, Adroildo Gonçalves esteve presente na apresentação dos resultados da cartografia social. O líder da ocupação considera que o trabalho permite identificar as necessidades da população que vive no local: “O trabalho de cartografia social mostrou as questões de saúde e de saneamento básico que muitas vezes não são vistas pelos governantes”, destaca o morador.

Projeto para conectar residências à rede de esgoto

Um dos principais problemas da ocupação está relacionado ao saneamento básico. No local, 51% das casas estão sem acesso à rede de esgoto, 22% sem fossa e 10% sem banheiro. O cenário provoca problemas de escoamento e de drenagem de esgoto, impactando principalmente na saúde das crianças, além do meio ambiente, pois prejudica o solo. Com base no trabalho de cartografia social, uma série de ações foi apresentada por Marcelo Oliveira Caetano, professor do Programa de Pós-Graduação em Engenharia Civil da Unisinos, para combater os problemas relacionados ao esgoto.

De acordo com Caetano, o plano busca implantar rede de esgoto ligada às residências e para escoamento da chuva e está dividido em quatro etapas: rede de esgotorede de água da chuvaconexão e projeto de banheiro em cada casa da ocupação. “Será feito um projeto para desenvolver as caixas de coletas de esgoto para escoar a rede que serão conectadas às caixas das residências”, contextualiza o coordenador da Especialização em Engenharia de Saneamento da Unisinos.

(Foto: ObservaSinos)

O plano de ação para combate aos problemas de esgotos foi desenvolvido por estudantes da Unisinos, os materiais usados serão doados por empresas de São Leopoldo e a execução do projeto é pensada pelo Serviço Municipal de Água e Esgotos - Semae.

Ocupação Steigleder

ocupação Steigleder fica em uma área próxima à bacia de amortecimento da região nordeste e de proteção contra inundações, sendo esse um dos principais problemas. Possui 15 hectares e reúne 175 famílias, o que totaliza a população de 448 moradores. Os resultados da Cartografia Social na localidade foram apresentados por Francisco Manoel Tognoli e Adriane Bril Thum, no dia 31 de maio de 2022, na Unisinos.

Conforme o pesquisador e professor da pós-graduação em Geologia, em relação aos aspectos sociais da população, 59,8% são brancos, 31% são pardos e 6,4% são negros. Na perspectiva de Tognolli, os números são semelhantes aos identificados na Renascer. Pelo grande número de crianças, 151 entre 0 e 12 anos, 68% dos moradores são estudantes.

 (Foto: ObservaSinos)

Ao entrar na questão da renda das famílias, o estudo evidencia que 37,6% vivem com apenas um salário mínimo e 40,1% com até meio salário mínimo. Neste momento, o valor da renda é pouco superior a R$ 1,2 mil reais. Ainda neste aspecto, a cartografia social identifica que 53,7% são beneficiárias de programas de assistência social, 82,3% trabalham na área de serviço, 52,3% têm trabalho informal e 3,4% são aposentados. Sobre o último índice, o número é inferior ao de pessoas com idade para estar aposentada da ocupação.

Mais um indicador analisado pela cartografia social é o de saúde. Conforme as entrevistas mostraram, 26,2% da população possui alguma doença crônica, principalmente diabetes e hipertensão. Na ocupação, a alimentação é baseada em carboidratos e proteínas, com destaque para ovo e frango, além de frutas, legumes e verduras. Quando perguntados sobre como a comunidade ajuda na tua vida, a maior parte das respostas foram na linha da alimentação, moradia e não ter contas de água e de luz.

Pela proximidade com a estação de trem Rio dos Sinos e de paradas de ônibus, 59% responderam que usam transporte público, no aspecto de mobilidade urbana. De acordo com o exposto por Tognolli, a grande preocupação na ocupação Steigleder é o saneamento básico, como identificado na Renascer.

 (Foto: ObservaSinos)

Na Steigleder, 21% das casas são sem banheiros, 45,9% sem fossa e 100% não possuem acesso a rede de esgoto. Aqueles problemas se somam à facilidade de inundação da área, uma vez que está localizada próxima a uma lagoa, que faz parte da bacia de amortecimento da região, na planície de inundação do Rio dos Sinos. "Considero as inundações o principal problema na ocupação Steigleder", afirma o professor da Unisinos.

Morador há oito anos, Cleber dos Santos Martins é uma das lideranças da Steigleder. Ele afirma que a ocupação o acolheu e permitiu ter uma moradia com a esposa e os dois filhos. "A Cartografia Social permitiu saber o número de jovens, mulheres e crianças da ocupação, pois muitas vezes querem diminuir a quantidade de pessoas que vivem aqui, por exemplo", relata o morador sobre a importância do trabalho desenvolvido pelo projeto.

Neste momento, a ocupação Steigleder passa pela regularização fundiária da área junto à administração municipal de São Leopoldo. Em 6 de abril deste ano, o prefeito, Ary Vanazzi, e a secretária municipal de Habitação, Andréia Camillo Rodrigues, assinaram o decreto de desapropriação por interesse social de parte da área que era privada, na Tenda da Residência, espaço de convivência comunitária da ocupação. A Steigleder está localizada no bairro Santos Dumont, na cidade do Vale dos Sinos.

Ocupação Container

ocupação Container é formada por 90 moradores e fica em um quarteirão na cidade de São Leopoldo. A comunidade, que fica próxima da estação de trem Rio dos Sinos, conheceu os dados da cartografia social no dia 1º de julho de 2022. A atividade reuniu lideranças da ocupação e participantes do projeto tanto da Unisinos como das secretarias municipais de São Leopoldo.

O objetivo do encontro foi apresentar os resultados da cartografia social, entender o que indicam e o que poderá ser feito a partir dos dados coletados. A atividade foi conduzida por Adriane Brill Thum, professora da Escola Politécnica da Unisinos. No início da atividade, Thum explicou que a Container tem um perfil diferente das outras ocupações que receberam o projeto. "Cada uma exige diferentes ações do poder público", explica ela.

Em relação aos responsáveis das famílias, são 29 na localidade, a idade média é 41 anos. Sobre a renda dos líderes na Container, o número de pessoas com carteira assinada é superior na comparação com as demais ocupações, uma vez que 34,5% tem carteira assinada.

A ocupação possui 24 crianças com menos de 12 anos, o que representa 39,3% dos moradores. O índice mostra a presença significativa deste público. Faz-se necessário, porém, analisar se todas as crianças estão incluídas em espaços protetivos e garantidores do seu desenvolvimento socioeducativos.

No aspecto saúde, algo comum nas ocupações é que não recebem visita do agente comunitário de saúde, ou seja, a Estratégia de Saúde da Família – ESF não se configura como ação junto às comunidades moradoras das ocupações. Esta realidade também se manifesta na Container. Ainda neste tópico, 90% da população que reside no local se utiliza do posto de saúde ou da Unidade de Pronto Atendimento - UPA. Por fim, neste item, 31% possuem doenças crônicas - hipertensão, diabetes, depressão e problema na coluna.

Quando perguntados sobre como a comunidade ajuda, os responsáveis das famílias afirmaram que na alimentação e na moradia. Em relação à alimentação algumas das conquistas vêm dos acessos e partilhas da Rede Solidária São Léo. Antes de residir na ocupação, 41,3% moravam em casa alugada, 39% de favor e 20,6% residência própria. Sobre a mobilidade urbana, 59% é usuária de transporte público. Dentre aqueles que possuem veículo próprio – bicicleta, carroça, carro ou moto – 42% usam para lazer.

Em relação ao saneamento na ocupação, 3,5% das casas não têm banheiro, 20,6% sem fossa e 37,9% das residências não têm acesso à rede de esgoto. Inclusive, o principal problema da Container são os problemas oriundos da falta de saneamento, que dificulta a vida dos moradores, já que não dá vazão ao uso dos banheiros, inundando as casas de dejetos, provocando desconforto às famílias, conforme anunciaram os moradores na reunião. Outras dificuldades apontadas por eles são a alimentação, água, luz e calçamento.

A análise destes dados pelos líderes da ocupação, apontou a necessidade de ampliar o diálogo com os demais moradores, com as presenças da gestão municipal, em vista de elucidar os processos que estão em implementação para a regularização do solo, assim como em relação às garantias de saneamento, água e luz. A agenda foi firmada para 4 de agosto de 2022, às 16h. Outro encaminhamento deu-se em relação à busca de assessoria jurídica para compreender o processo nesta área.

Próximos passos

No dia 28 de junho, a equipe responsável pelo Projeto da Cartografia realizou encontro de avaliação e planejamento na Sala Ignacio Ellacuría e Companheiros, no Instituto Humanitas Unisinos - IHU. A atividade foi realizada na modalidade híbrida, onde foram identificados os resultados alcançados pela Cartografia até o momento. Foi um trabalho coletivo com representação dos três agentes implicados à realidade estudada: comunidades, poder público e Universidade. Esta parceria, que vai oportunizando a aproximação de outros agentes comprometidos com a moradia, a cidadania e a cidade, apresenta a visibilização das realidades e seus determinantes.

Esta análise aponta também propostas de intervenção, como possibilidade de afirmação da dignidade de vida desta população, que vive, indiscutivelmente, múltiplas dimensões de violências e violações de direitos. Em cada uma das ocupações foram apontadas perspectivas de continuidade de ações, que apontam melhores condições de vida das famílias e das comunidades, assim como indicações para os procedimentos necessários à regularização do solo.

Identifica-se uma aproximação da universidade com a realidade local e das comunidades com a Universidade e a gestão municipal. Da mesma forma, percebe-se avanços na articulação das políticas públicas e dos seus gestores. Movimentos indispensáveis para a afirmação da cidade com os cidadãos.

De acordo com Sabrina Backes, Assistente Social e integrante do projeto pela Secretaria Municipal de Habitação, diante da construção contínua das políticas públicas municipais, a cartografia social das ocupações urbanas traz novos contornos e desafios para a gestão municipal. “Conhecer a especificidade de territórios antes invisibilizados, evidencia a necessidade da construção conjunta e coletiva das políticas públicas, levando-se em conta as pessoas e as suas realidades cotidianas, nestes espaços de produção de vida e de (sobre)vivências”, afirma ela.

No seguimento do trabalho da cartografia, ainda estão indicadas 14 ocupações para a sua implementação. Para tanto, será necessária a revisão do instrumento de cadastramento das comunidades e das famílias. Esta revisão está agendada para o dia 14 de julho de 2022 das 9 às 17h no Instituto Humanitas Unisinos – IHU. Outra ação que se constitui em mais um passo deste projeto é a transferência dos dados ao Sistema de Informação Geográfica - SIG e a disponibilização dos dados para as lideranças das ocupações para o acesso e gestão da atualização das informações da comunidade e das famílias na Cartografia.


Com as contribuições de Francisco Tognoli, Adriane Brill Thum e Sabrina Backes.