Vida em primeiro lugar

Em diversas cidades do Brasil a articulação do Grito dos/as Excluídos/as somaram forças nas manifestações promovidas pela articulação Fora Bolsonaro. Foto: Arquivo Grito dos/as Excluídos/as Florianópolis (SC)

Por Marcos Vinicius dos Santos* | Jubileu Sul Brasil

As articuladoras e articuladores do Grito dos/as Excluídos/as enxergam um país que é reflexo de um governo que optou por políticas que colocam o lucro em primeiro lugar e que em conjunto com a crise da pandemia da Covid-19 acumula alta no desemprego, na fome, na devastação ambiental, na retirada de direitos da classe trabalhadora do campo e da cidade, dos povos originários e um aumento estarrecedor do custo de vida, sobretudo, com a alta nos preços dos alimentos, gás, combustível e energia elétrica.

Em face a essa realidade o 27° Grito dos/as Excluídos/as propõe um debate completo trazendo diversas ações para fortalecer os excluídos e excluídas. A primeira atitude é denunciar os mecanismos de exclusão cometidos pelos governos federal, estadual e municipal. Ações que geram morte, violência, desigualdades social e corrupção. Essa denúncia se dá pelos excluídos e excluídas nas ruas, com faixas e palavras de ordem, criando canais de comunicação para que a sua voz seja propagada e ouvida.

Uma das articuladoras nocionais do Grito, Carla Cristiani de Oliveira Guimarães, da Pastoral Social Regional CNBB Sul 4, Santa Catarina, lembra que embora exista uma ação dinamizada pelas pastorais sociais, movimentos e organizações, o Grito só tem sentido com a presença dos excluídos e excluídas.

“É fundamental construir os processos do grito com as comunidades de periferias, população em situação de rua, ocupações urbanas e rurais, povos indígenas, população negra, juventude, classe trabalhadora. O Grito é o lugar dos excluídos, que são os sujeitos desse processo e que vão denunciar os mecanismos que geram exclusão, e apontar as saídas coletivas de mudança”, contou em entrevista à Rede Jubileu Sul.

O articulador na Diocese de Roraima, irmão Danilo Correia Bezerra, destaca aspectos do cenário nacional diante da pandemia e da crise política que o país atravessa.

“Estamos num contexto muito difícil e desafiador. Atravessamos uma pandemia, ou como nos diz frei Beto: uma sindemia, que é essa relação entre a questão sanitária e outros desafios políticos, sociais e econômicos. Enfrentamos também uma política de morte, um governo genocida, com isso já temos mais 500 mil mortes. É um vírus? Sim, mas é também um governo ausente com relação às políticas públicas e aos direitos sociais que, de fato, posam combater a essa pandemia ou sindemia”, afirma.

O irmão Marista e articulador do Grito em Roraima, Danilo Correia Bezerra, fala sobre o cenário político brasileiro

A equipe do Grito atua em rede, buscando a construção com os movimentos sociais do campo e da cidade, sindicatos, pastorais, igrejas cristãs, religiões de matriz africana e diversas organizações que estão alinhadas com a temática.

Esse é um processo que não é realizado em apenas um dia pois, embora o dia 7 de Setembro concentre todas as movimentações nacionais, o grito não termina ali.  O ano inteiro conta com mobilizações que se dão por meio da formação permanente, rodas de conversas, acompanhamento dos processos de mobilizações, consciência crítica da população, atividades culturais e manifestações populares. 

Uma tarefa que não é nada fácil, mas que este ano foi considerada especialmente desafiadora por Carla Cristiani. A articuladora vê dificuldades em promover um grande ato de rua, num cenário de pandemia que exige distanciamento e segurança sanitária que se soma ao crescente processo de criminalização dos movimentos populares de reivindicação de direitos.

Para Rosilda Ribeiro, voluntária da Pastoral Carcerária e articuladora do Grito no Mato Grosso do Sul, é preciso superar o processo de naturalização das violações de direitos.

“Penso que o maior desafio para a dimensão social seja o processo intenso e naturalizado de alienação que vivemos, o que impossibilita a percepção da realidade e as maneiras de orientação das decisões. A força do Grito é exatamente a mobilização social consciente, já que não é de hoje que se perde direitos, embora a velocidade estava elevada na atualidade”, constata.

Apesar disso, há otimismo nas novas dinâmicas que as diversas vozes nacionais encontraram para organizar as  lutas. Os processos de articulação do 27º Grito dos/as Excluídos/as já estão acontecendo em boa parte das capitais e municípios que já realizaram diversos atos, incluindo a produção de materiais próprios para cada região, de acordo com as prioridades das lutas locais.

Articulação em rede e Dia “D” do Grito

Pautado na diversidade, a organização do Grito ganha um contorno particular em cada local onde acontecem as mobilizações. Ari Alberti, membro da Coordenação e Secretaria Nacional do Grito dos/as excluídos/das  e agente do Serviço Pastoral dos Migrantes e, define o movimento como um “espaço aberto de animação e profecia, de denúncia e de anúncio. Em vista disso, o processo de construção do grito exige constante reinvenção, que seja criada uma linguagem com ousadia porque a linguagem escrita falada e discursiva ela é excludente, então a linguagem dos/as excluídos/as ela é muito simbólica, ela é muito poética, musical, com desenho, com arte. É assim que os/as excluídos/as  compreendem e se sentem capazes, se sentem sujeitos do processo”.

Ari Alberti fala sobre a identidade e o processo permanente de articulação do Grito.

Responsáveis por construir essa rede nacional de mobilização, articuladores e articuladoras, animadores e animadoras do Grito dos/as excluídos/das, são as maiores riquezas dessa comunidade, sempre preocupada com o processo de articulação permanente do Grito, que tem um antes, um durante e  um depois do dia 7 de Setembro.

Ao experimentar esse desafio de manter a mobilização durante o ano todo, o grupo  pensou na estratégia de mobilização permanente com o  chamado dia D do Grito. Assim,  as articulações locais são estimuladas a mobilizar, sempre no dia 7 de cada mês, um momento de  manifestação, encontros, rodas de conversa no estado,  no município, nas comunidades para fortalecer o Grito, para construir caminhos e propostas políticas a partir da organização popular.

“No ano passado, no mês de junho fizemos um primeiro encontro de articuladores/as de forma virtual. Foi muito rico, muito produtivo e, nesse encontro  refletindo a partir das experiências de alguns pré-gritos, a gente se desafiou há colocar na agenda que o dia 7 de cada mês seria um dia, um momento uma data importante de você fazer alguma manifestação na sua cidade, no seu estado, chamada de dia D do Grito. Então, de repente a gente contribui para criar uma cultura, que para o grito tem sido muito importante. A gente circula as informações de atividades locais, outras pessoas conseguem participar também pelas redes sociais, então tem sido um ponto forte de animação para a construção do Grito dos/as excluídos/das”, explicou Ari Alberti.

Unindo forças na mobilização popular

Desde 2019 o Grito dos/as Excluídos/as vem recebendo apoio da Rede Jubileu Sul Brasil através da ação de Ajuda a Terceiros, iniciativa que integra a ação Fortalecimiento de la Red Jubileo Sur/Américas en el logro del desarrollo y de la soberanía de los pueblos latinoamericanos y caribeños, cofinanciada com recursos da União Europeia**.

Essa troca entre as duas redes vem fortalecendo cada vez mais as ações de comunicação do Grito, permitindo uma mobilização nacional ainda maior. Segundo Ari, administrar a mobilização de  recursos para a realização do Grito sempre é um grande desafio, mesmo assim com a ajuda que recebe a coordenação não deixa  de produzir os materiais necessários.

Na foto, as Rodas de Conversas produzidas pelo Regional CNBB Sul 4. O conteúdo está disponível no link: https://bit.ly/rodasgrito2021.

“Essa possibilidade de apoio financeiro  a partir da ação de Apoio a Terceiros  deu um respiro maior para trabalhar com mais tranquilidade a produção e distribuição dos materiais que da unidade ao nosso Grito. Mas, sobretudo, deu uma ajuda importantíssima para a comunicação do Grito. A comunicação era sempre bastante difícil, da gente poder fazer repercutir, poder noticiar aquilo que acontecia”, lembrou.

Para este ano de 2021  a articulação do Grito dos/as Excluídos/as ainda prepara uma coletiva de imprensa que será transmitida pelas redes sociais para mobilizar a mídia com as pautas propostas no tema e no lema do 27º Grito dos/as Excluídos/as: Vida em primeiro lugar. Na luta por participação popular, saúde, comida, moradia, trabalho e renda já! A coletiva está  marcada para o dia 28 de agosto às 10h, horário de Brasília. Ainda serão lançadas uma série de materiais de apoio como podcasts, pequenos vídeos para contribuir com a dinamização e animação nas redes sociais dos pré-gritos e os chamados dia D do Grito. Para acompanhar cada uma das propostas para as mais diferentes localidades e regiões, acompanhe o site www.gritodosexcluidos.com ou nas redes sociais: www.instagram/grito.dos.excluidoswww.facebook.com/grito.dos.excluidos

Ouça o Hino do 27º Grito dos/as Excluídos/as

*Com supervisão de Jucelene Rocha

**O conteúdo dessa reportagem é de responsabilidade exclusiva da Rede Jubileu Sul Brasil e não representa necessariamente o ponto de vista da União Europeia.