Membros do Executivo e Parlamentares participam do segundo dia do Seminário Nacional das Pastorais Sociais e 6ª Semana Social Brasileira
Por Henrique Cavalheiro | Conselho Pastoral dos Pescadores
Fotos: Nívea Martins | Cáritas Brasileira
O segundo dia do Seminário Nacional “O Brasil que temos”, das Pastorais Sociais e 6ª Semana Social Brasileira (6ªSSB), começou com a participação de membros do Poder Executivo e Legislativo. O encontro das autoridades com os representantes das Pastorais Sociais e Movimentos Populares foi um momento de troca de experiências dos últimos anos para as comunidades e de apresentação de reivindicações dos territórios e dos mais necessitados. O Seminário que ocorre na Casa de Encontros Dom Luciano Mendes de Almeida, em Brasília até sexta-feira (3/3), reflete sobre o país atual e o que deve ser construído com dignidade para todos os povos.
Na abertura das explanações, Dom José Valdeci Santos Mendes, presidente da Comissão Episcopal Pastoral para a Ação Sociotransformadora da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (Cepast-CNBB), destacou a importância do diálogo e da participação popular nas esferas de poder. “A partir da aliança e do diálogo que traçaremos o novo caminho. Caminho de luta pela vida, pela justiça, por uma sociedade mais justa e fraterna. Destacamos a solidariedade para com os que sofrem”, disse Dom Valdeci. Para o bispo, são transformadoras as palavras do Papa Francisco na carta encíclica Fratelli Tutti:
“Cada ato de violência cometido contra um ser humano é uma ferida na carne da humanidade; cada morte violenta “diminui-nos” como pessoas. (...) A violência gera mais violência, o ódio gera mais ódio, e a morte mais morte. Temos de quebrar esta corrente que aparece como inelutável.”
(Papa Francisco)
A Igreja é alimentada pela esperança de um novo tempo que exige lucidez para o diálogo estratégico. “Onde tiver uma vida que seja negada e desrespeitada, nós não podemos cruzar os braços e ficarmos calados”, concluiu Dom Valdeci.
Para que os ministros e parlamentares pudessem compreender as discussões da 6ªSSB, Jardel Lopes, da Equipe Executiva das Pastorais Sociais, fez uma apresentação do painel de acúmulos da atuação das pastorais sociais nos últimos anos e quais são as principais inquietações na realidade das comunidades em busca e valorização da terra, teto e trabalho.
“Destacamos o crescente número de conflitos no campo. Ameaça aos territórios dos povos tradicionais e originários. Despejos de famílias em situação de vulnerabilidade. A violência em comunidades e periferias”, pontuou Lopes. “As reformas trabalhistas e previdenciárias dos últimos governos estão precarizando o trabalho e suas relações. O povo passa por insegurança alimentar. Muitas pastorais sociais são o único espaço de acolhimento e auxílio para pessoas oprimidas e marginalizadas”, finalizou.
O Poder Executivo na escuta dos anseios populares
O passado próximo ainda traz consequências para as populações, práticas e decisões do governo anterior aumentou violências e intolerâncias de todas as formas. Para o Ministro Márcio Macedo, Secretaria Geral da Presidência da República, falou do tempo de falta de empatia que dizimou diversas vidas e realidades. “Os perigos nos rondam, mas estamos em um novo tempo. O exemplo do Papa Francisco, nos ensina empatia, amor ao próximo e enfrentamento das mazelas de uma sociedade dominada pelo capital sem sensibilidade com os que mais precisam”, disse o ministro.
“O país voltou ao mapa da fome. Temos neste momento 33 milhões de pessoas passando fome. 125 milhões de pessoas com algum déficit alimentar. Isso não pode ser esquecido e não será”, completou Macedo. “A volta do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional – Consea é importante, pois este desafio de reconstrução deve ter a participação de toda a sociedade. O tema da fome é prioridade para o governo”, ponderou.
Para o Ministro Paulo Teixeira, do Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar, é preciso valorizar o homem do campo e o respeito pelo território e pela produção consciente de alimentos. “Nós queremos plantar na terra, queremos agricultura agroecológica. E com isso, não podemos deixar de falar da reforma agrária. Este novo governo quer fortalecer as mulheres, os jovens, os negros, demarcar terras indígenas e dar soberania para as comunidades”, destacou Teixeira.
Enviada pela ministra das mulheres, Aparecida Gonçalves, a secretária executiva do Ministério, Maria Helena, reafirmou o papel das mulheres na reconstrução do Brasil. “Temos uma expectativa sobre as mulheres. Vejam que estava sozinha nessa mesa de hoje mais cedo, ou seja, não é uma mentalidade só da sociedade, mas nossa, temos que mudar isso”, afirmou Helena. “Não podemos mais conviver nesta sociedade de ódio. A pobreza neste país tem cor e gênero. Precisamos construir com igualdade. Queremos fazer deste país, urgentemente, diferente”, disse.
Para Pedro Pontual, diretor de Educação Popular da Secretaria Nacional de Participação Social, existe um tema importante nestes desafios da atualidade que é o do retorno da participação social na governança do país. “O Brasil precisa ir além dos instrumentos de escuta já conquistados e edificar novas formas de participação popular, uma verdadeira democracia direta e assertiva”, afirmou Pontual.
“A experiência das pastorais sociais nos territórios é importante para se criar estas novas formas de participação. Um processo educativo que permita que os participantes adquiram consciência política”, concluiu.
O parlamento precisa ouvir o povo
Dando início aos posicionamentos dos parlamentares, o deputado federal Reimont Otoni (PT-RJ), demonstrou o convite evangélico para a inquietude perante as desigualdades e opressões. “Somos inquietos. Não concordamos com uma sociedade de privilégios. Disseram para nós que não adiantava lutar contra o Capital e nós nos organizamos. É pela resistência dos movimentos sociais que estamos aqui. Essa inquietude deve nos acompanhar para entender que precisamos construir um novo processo”, discursou Otoni.
A relação entre oprimido e opressor também deve ser refletida pelas pastorais sociais da Igreja, para que os verdadeiros culpados sejam indicados e responsabilizados. “É uma luta não só de sonhos, mas de esperança e realidades. A regra da sociedade é dizer que a culpa da opressão é do oprimido. Porém somos inconformados e insatisfeitos com isso. Que possamos olhar para o parlamento e o governo e dizer ‘nós’ e não ‘eles’”, concluiu.
Segundo a deputada federal, Natália Bonavides (PT – RN), os desafios estão apresentados e este início de ano é de extrema importância para os que querem construir um novo projeto de país. Para Bonavides, neste planejamento de esperança o território é fundamental para as comunidades. “Ninguém existe fora de viver em algum lugar. Esta é uma luta de sempre da classe trabalhadora. Acompanhamos um governo que criminalizou quem luta por terra no Brasil. Temos que lutar com os desafios de autoridades que acham que com uma canetada conseguem anular pessoas e suas batalhas e histórias”, disse a deputada.
“Retomamos a democracia por meio de uma frente ampla. A melhor forma de contribuir na reconstrução do Brasil é se estas pautas forem construídas com participação popular”, finalizou Bonavides.
A deputada pelo Distrito Federal, Erika Kokay (PT-DF), explanou sobre a metodologia política que foi capturada pelo ódio no Brasil. Assim, segundo a deputada, o negacionismo se emaranhou nas realidades de existência, ou seja, houve uma captura do Estado. “Esta tentativa de impedir a nossa existência humana foi fortalecida, mas nossas raízes são profundas em nossa ancestralidade, resistimos, e estamos aqui em reconstrução do país que queremos”, afirmou Kokay.
Para a deputada, o direito ambiental é generoso, pois se cuida para quem ainda vai chegar. “Temos uma necropolítica que atinge determinados corpos de maneira mais rude e letal. As balas não são perdidas, elas encontram sempre os mesmos corpos. Precisamos puxar os fiapos da vida e construir o novo amanhã”, colocou Erika. “Este povo é filho de Dom Helder e ousou a dizer que a centralidade da política deve ser as pessoas”, e completou, “Ou a gente radicaliza a democracia, ou a democracia estará radicalizada e frágil”.
“Os desafios estão postos, temos a missão histórica de construção da territorialidade, resistências e trincheiras políticas afetivas”, finalizou Kokay.
Para finalizar a participação de parlamentares, o deputado federal Chico Alencar (PSOL – RJ), alertou sobre a voz do povo organizado que não chega ao Congresso Nacional, e que neste cenário não adianta falar em união e reconstrução, pois não haverá transformação verdadeira. “Estamos na luta por um novo modelo econômico. A acomodação dos deputados em seus salários e privilégios dificulta a percepção da realidade das comunidades. A tarefa é imensa de mudança de mentalidades e de esculta”, ponderou Alencar.
Em um contexto religioso e de participação da Igreja, o deputado destacou a Campanha da Fraternidade 2023 e o tema da fome. “Gosto muito da quaresma, pois nos chama à reflexão. Quando Jesus é tentado no deserto, o pão oferecido pelo demônio é o pão acumulado, o pão individual do capital, queremos o pão coletivo e para todos”, afirmou o deputado. “A burguesia está nas estruturas da sociedade, inclusive eclesiásticas, precisamos da chama da esperança para uma mudança concreta”, finalizou.
Nesta 6ª edição da SSB – iniciada em 2020 e segue até 2023 – o tema pautado é o “Mutirão pela Vida: por Terra, Teto e Trabalho e os eixos: Democracia, Economia e Soberania”, e com a proposta da construção do Projeto Popular “O Brasil que queremos: o Bem Viver dos povos”, a partir dos acúmulos das cinco edições anteriores.