SSB
22/11/2020

Com uma videomensagem do Papa, encerrou-se neste sábado o evento "Economia de Francisco", dirigido a jovens empreendedores de todo o mundo. Num longo discurso, o Pontífice encorajou a juventude mundial a não ter medo de sujar as mãos, sem atalhos, para transformar a economia e, consequentemente, toda a sociedade. Depois da crise, não voltemos a um consumismo febril, mas aproveitemos a oportunidade para nos colocar a serviço do bem comum.

Por Bianca Fraccalvieri – Vatican News

"Mais humano do que o outro"

O Pontífice agradeceu a participação numerosa e falou palavras de encorajamento aos jovens citando as encíclicas Laudato si e Fratelli tutti, mas também com referências a seus predecessores São Paulo VI, São João Paulo II e Bento XVI. 

Francisco deu voz à juventude que, como ele, é concorde em afirmar que “precisamos e queremos uma mudança”, sem se deixar levar pela lógica do “sempre foi assim”.

Hoje, as injustiças, as desigualdades, a exclusão não são mais toleradas. A cultura do descarte deve ter os seus dias contados. Ninguém tem o direito de se sentir “mais humano do que outro”.

Se é urgente encontrar respostas, é indispensável fazer crescer e apoiar grupos dirigentes capazes de elaborar cultura, iniciar processos – “não se esqueçam desta palavra: iniciar processos” – traçar percursos, alargar horizontes e criar pertenças. 

Mística do bem comum

Para isso, é imprescindível mudar estilo de vida e os modelos de produção e consumo e retornar “à mística do bem comum”. “A fome não depende tanto da escassez material, mas da escassez de recursos sociais”, disse Francisco citando o Papa emérito. 

O Santo Padre recordou uma experiência que fez muitos anos atrás, ainda na Argentina, na década de 1970 – uma experiência que pode ser vivida também no Brasil: a dos condomínios fechados.

“Tive que visitar alguns noviços da Companhia e cheguei a uma cidade e, depois, andando por lá, alguém me disse: Não, ali não se pode ir, é um bairro fechado. Dentro havia muros e dentro havia casas, ruas, mas fechado: ou seja, um bairro que vivia na indiferença. Impressionou-me muito ver aquilo…Mas depois isto cresceu, cresceu, cresceu… e estava em todos os lugares. Mas eu me pergunto: o seu coração é como um condomínio fechado?”

É tempo de ousar

É por isto que é “tempo de ousar o risco de favorecer e estimular modelos de desenvolvimento, de progresso e de sustentabilidade em que as pessoas, e especialmente os excluídos, entre os quais a irmã terra, deixem de ser uma presença meramente funcional, para se tornar protagonistas de sua vida, assim como de todo o tecido social. (…) Não pensemos por eles, mas com eles”.

Em outras palavras, política e economia devem estar a serviço da vida, especialmente da vida humana. A medida do desenvolvimento é a humanidade. Sem esta centralidade e orientação, ficaremos prisioneiros de um círculo alienante que somente perpetuará dinâmicas de degradação, exclusão, violência e polarização.

A propósito, disse ainda o Papa, descreditar, caluniar ou descontextualizar o interlocutor que não pensa como nós é “um modo de se defender covardemente das decisões que eu deveria assumir para resolver muitos problemas”. 

Sujar as mãos, sendo fermento

A perspectiva do desenvolvimento humano integral é uma boa notícia a profetizar e aplicar, disse ainda o Papa. E como se faz? Sem atalhos, mas sujando as mãos, sendo fermento. "Passada esta crise sanitária que estamos vivendo, a pior reação seria cair ainda num febril consumismo e em novas formas de autoproteção egoísta. Colhamos a oportunidade e coloquemo-nos todos a serviço do bem comum. Que no final não existam mais 'os outros', mas um grande 'nós'.” 

Eis então a exortação final de Francisco:

“Não tenham medo de se envolver e tocar a alma das cidades com o olhar de Jesus. Não tenham medo, porque ninguém se salva sozinho. Ninguém se salva sozinho. A vocês jovens, provenientes de 115 países, dirijo o convite a reconhecer que necessitamos uns dos outros para dar vida a esta cultura econômica, capaz de fazer germinar sonhos, suscitar profecias e visões, fazer florescer esperanças, enfaixar feridas e criar relações.”

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